O crescimento das plataformas de apostas no Brasil nos revela algo no mínimo inquietante: cada vez mais pessoas perdem não apenas dinheiro, os laços familiares e a saúde mental se deteriora. Por que insistimos em jogar, mesmo sabendo que o resultado que é a derrota está premeditada e algo anunciado a perdemos está na nossa cara? Prometendo ganhos rápidos e a ilusão de um controle sobre o acaso.
Existe uma busca nossa atravessada pelo desejo, um movimento incessante que nunca encontra satisfação plena. Nesses jogos, esse desejo é seduzido (como uma miragem que se cria manifesta ao longe) por uma promessa ilusória de preenchimento: o “grande prêmio” que resolveria “todos os problemas”. Porém, na clínica vemos que essa falta é estrutural; não há ganho que satisfaça alguém definitivamente.
Mesmo eventualmente ganhando alguns prêmios seguiremos apostando pois a sensação que posso ganhar mais prevalece e são as nossas tendências a compulsão à repetição mesmo diante de algo que nos coloca e produz sofrimento enquanto que ao mesmo tempo, causa uma fuga de uma realidade dolorosa que se manifesta.
O que torna as apostas tão sedutoras é que a cada rodada representa não apenas a chance de ganhar, mas um encontro com o que Lacan chama de gozo – aquele excesso que escapa à lógica do prazer e que pode ser destrutivo. Na compulsão a repetição incessante a perdas, encontramos algo mais profundo: o sujeito preso a uma espécie de circuito dessa repetição, se vendo incapaz de abandonar o jogo, alienado a ele, mesmo que isso signifique e custe perder praticamente tudo.
Não é apenas sobre o dinheiro apostado, mas sobre uma tentativa fantasiosa de lidar com angústias que o jogador nem sempre consegue nomear. A aposta se torna uma maneira de evitar e não lidar com o vazio, uma forma breve de se anestesiar diante de um mal-estar interno que o persegue.
Com o aumento de casos de forma exorbitante, o governo brasileiro agora propõe intervenções regulatórias. Mas será que regulamentar é suficiente agora que a situação se tornou insustentável? Na psicanálise, entendemos que a verdadeira mudança começa quando o sujeito se interroga sobre o que realmente está buscando. Por que continuar jogando, mesmo quando o prejuízo é tão evidente?Além das medidas legais, é fundamental que busquemos compreender as raízes reais desse problema singularmente e não perdemos a chance de respondermos a essas questões.
Há caminhos possíveis para compreender esse movimento e encontrar outras formas de lidar com as angústias da vida. O jogo não precisa ser uma das respostas para nossa angústia pois ganhando tudo ou perdendo essa angústia precisará e estará ainda no mesmo lugar para ser nomeada e nenhum prêmio fará isso por você.